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Considerando o ponderável

10/10/2015 21:45

 

                  

Caros internautas, tenho me exaurido em outras preocupações e não tenho postado as crônicas que vocês tanto gostam neste nosso blog. O campo da escrita é como o campo da lavoura, se a lavoura da escrita é preenchida e consumida pelas ervas daninhas do cotidiano, ficamos então sem espaço na mente para desenvolver alguma criação no ato de escrever. O segredo de minhas preocupações por alguma ausência é o acesso. O acesso é grato, mas eu sou mais agradecido, graças a Deus. Não vale falar para não causar inveja, posto que, por vezes, dá uma coceirinha na língua. Que fique a coceirinha, pois não falo. Contudo, tudo é muito justo e compreensível, são dez anos de companhia de nossos textos reflexivos, degustados e compartilhados muitas vezes no silêncio da alma. O silêncio tem sido nossa cumplicidade, e, na baixa e sem alarde, o motivo maior do reconhecimento por parte de vocês que de longas datas nos acompanham. Silenciosamente fica firmado nosso pacto dos cem mil acessos mês no site. Somos pioneiros na crônica online com edição de imagem desde de 2007; esta mesma crônica que vinha desde de 2004 em grande acesso em outro site de notícias de Alagoas. Neste mesmo ano de 2004 fomos pro rádio às sextas a tarde, num programa líder de audiência. Então a semente germinou, germinaria até se eu não quisesse. Nossos laços não são de ontem, e por isso que estamos aqui, juntos em nossas reflexões.

Mas o que cogitei hoje pela manhã foi naquelas coisas que todo mundo anda pensando por aí; nas crises da existência da nossa sociedade contemporânea. E me atenho ao indivíduo e ao comportamento desta sociedade pós globalização, a que eu chamaria de bárbaros. O cristianismo levou mil anos para converter os bárbaros da Europa e chegar a idade pós moderna de nosso dias. A globalização levou apenas 20 anos para germinar a barbárie que vivemos em todos os continentes. Aí perguntamos, onde estamos indo com esta sociedade de consumo que tem nos levado ao caos e as incertezas. Não sei bem aonde estamos indo, só sei que já começamos aspirar as mudanças desses ventos para alguma outra alternativa da boa convivência e dos bons costumes. Tudo é uma questão de como estamos preparando nossas mentes futuras dentro deste caos secular, e se iremos precisar de rever nossos valores, que, se já ultrapassados alguns, como poderemos suprir-lhe as lacunas. Fato é que os regionalismos, por exemplo, podem antes de serem atropelados pela massificação do modo de vida generalizado, serem, por outra, fatores de compartilhamento da convivência humana interativa. Podem ser vetores de troca de informações e diminuição de distâncias culturais. Essa mistura é um caminho sem volta, tão notada pela plataforma da internet e das telecomunicações de um modo geral. Daí, já se pergunta: caminha a humanidade para sua condição inevitável de uma sociedade mestiça, como a brasileira, por exemplo? A barbárie foi gerada pela luta pelo consumismo de uma sociedade que exige e gera estímulos ao consumo e ao prazer? As duas grandes guerras, as epidemias, as lutas de classe, e a rebeldia da juventude do século 20 estão sendo vomitadas para os dias atuais deste novo século? São perguntas. O fato é que a juventude continua com as mesmas aspirações do século passado, ou seja, um emprego estável e um estado solidário, e que em 2050 o mundo terá 10 bilhões de pessoas. Creio que aí teremos atingido o ápice para repensar tudo outra vez.

Talvez dentro dessa realidade da barbárie, pudéssemos cultivar mais os nossos sentimentos bons, e sem ser piegas, pensar no amor ainda como uma bandeira a ser levantada. Porque nesta sociedade que vivemos estamos a produzir mentes frias, pessoas robotizadas para a violência em todos seus aspectos, e para a frieza de suas ações. E não precisa nem dizer que a sociedade está doente, isso é fato, estamos produzindo um mundo de psicopatas, e a convivência tem ficado muito ruim. Talvez tenhamos que nos mirar em Montesquieu, em Jacques Maritain, ou tenhamos que termos um pouco a gentileza e bondade do Príncipe, personagem do romance O Idiota de Dostoiévski. Ou tenhamos, enfim, que tramitarmos pelo mundo como uma espécie de Jesus Cristo ou Dom Quixote, que legaram valores de solidariedade e amor a humanidade. Talvez mesmo, tenhamos que cultivar nossos bons e sublimes sentimentos da alma, para que possamos ir clareando nossos dias futuros, sem medo de sermos chamados de idiotas.

 cronicjf@gmail.com

 

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Era um dia de primavera

01/09/2015 06:43

 

Deu na TV que praticamente em todo país estava chegando uma onda de calor. Como lá pro Sul era primavera, a temperatura em Porto Alegre naquele dia foi de um ameno 15º, mas as previsões meteorológicas davam um indicativo que iria passar tão logo para os 23º, chegando até aos 27º de lambuja. Naquele período não era normal tal temperatura. Peguei o telefone e quis saber de nossa acrópole maceioense com sua brisa marítima. Falaram-me que o calor havia chegado, e já sentíamos os 31º as 11: OO hs. da manhã. E nós que não somos beduínos do deserto, nem estamos em uma cidade do alto sertão, os 31º já nos incomodava pelo dia, e nossas noites estavam pelos 23º bem agradáveis; era nossa primavera-verão. Desliguei o celular, e com a cortina da janela semiaberta, tirei os olhos da TV. Num encarte em cima da cabeceira da cama, estava escrito uma estrofe de um autor desconhecido que dizia: “Sempre caminho olhando pra baixo; o chão avisa que é primavera nas flores de jacarandá. Penso em preto e branco, mas amo a cor lilás, e novembro. Tirei o meu anel com a pedra preta da gaveta.” Depois de ler esse pequeno trecho, tive um pressentimento de que a semana seria boa; e foi!

Nestes tempos modernos, onda de calor é preocupação para a baixa renda, por que a turma “in”, não está nem aí pra isso. Há uma nova geração de moças e rapazes que fogem do sol para conservarem uma pele hidratada, sem manchas, e clara. E quando são afrodescendentes, manterem uma pele sem manchas e sedosa, mostrando assim uma beleza tropical refinada. Visitam com frequência o dermatologista, e mesmo em Maceió, uma terra bronzeada pelo sol e mar, parecem que vivem em clima temperado. A tecnologia, por outra, também vai ajudando. De forma que, o pessoal mais ou menos vive bem climatizado. É climatização no apartamento todo, no escritório, nas lojas e shoppings, no carro, além de outros acessórios como filtro solar, óculos e película fumê. Na praia, um bloqueador solar fator 60, e uma ducha de água doce refrescante. Para este padrão de consumo, o Sol já perdeu a guerra.

Quando olho para trás e vejo quantos bons serviços trouxeram-nos a modernização, sinto que temos que ser otimistas com o tempo (eu ainda não sou, pela falta de igualdade, e a injustiça). Por que se criamos problemas de convivência humana nestes dias em que vivemos, não admitimos mais sermos aqueles dinossauros do passado recente, antes de termos entrado na era digital. Porém, mesmo com o domínio das previsões do tempo, e uma grande margem de acerto que hoje se tem, a natureza sempre apronta algumas surpresas. Naquela primavera, por exemplo, estava previsto calor e o dia amanheceu sem sol, e com uma garoa refrescante por toda manhã. A paisagem mudou, o jeito do céu fechado tornou a luz do sol quebrada, e tudo parecia de um jeito mais ameno. Então, tomei um café frugal, li o jornal naquela moleza descomprometida. Em seguida, dei um pulinho no mercado público (O de Porto Alegre é  interessante), fui ver algumas iguarias do lugar e sentir a alma da cidade, pois é no mercado público que se ver essas coisas. Depois voltei ao meu retiro e assim terminei a manhã. No meio dia fui a um restaurante de boa mesa, e a hora descambava pela tarde de uma forma perfeita, sem nenhum telefonema nem incômodo de qualquer natureza. No final da tarde, dei uma circulada e me presenteei um relógio, em cima de um dinheiro extra. A noite abraçou-me com carinho, e fui eu em sua brisa entregar-me aos prazeres da da noite. Cogitei ainda na noite que iria escrever uma crônica sobre aquele dia. Reservei-me ao meu mundinho, que por sinal, é bem pequeno. E murmurava a meus botões que naquele dia o mundo estava de bem comigo, e que os astros estavam a me ninar. Quem sabe até aquela chuvinha da manhã resolveu me dar uma mãozinha. Por que encontrei sorrisos de desconhecidos, lembrei com saudade de gente amiga e amizades antigas, daquele tipo que nos energiza. Fiz-me menino dentro do adulto calejado. Mas tudo por obra do acaso, sem planos, de um dia que passou as soltas. Como aquelas alegres, simples, e humildes borboletas amarelas que voavam pra lá e pra cá, em alguns lugares abertos no meio do concreto frio e indiferente. Foi um dia de primavera em que eu estava de alma agradecida; e por uma boa coincidência, fiz essas  reminiscências.

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Essa tal felicidade

23/08/2015 07:00

 

O corretor insistia em me vender aquele lançamento imobiliário com argumentos fortes, instigando-me sonhos e mudança de vida. Todo corretor é insistente; há alguns que exageram um pouco. Minha saída foi àquela infalível, de dizer que, no momento, não estou comprando nada, pelo contrário, estou até vendendo. E se a conversa se alongar muito, vou falando que o sujeito hoje em dia, dê graças a Deus quando ainda consegue segurar o pouco que tem, sem precisar vender. Com uma conversa dessas não há corretor que fique. Porém, eles ainda te ligam dizendo que seu crédito está aberto. O fato é que vida de apartamento é vida de pouco espaço. Mas, a gente termina se acostumando no correr dos anos, como um monge em sua cela. Veja que o homem a tudo se acostuma; pois quem se criou como eu, numa casa com quintal na beira de um rio, e na liberdade dos campos verdes do interior, não imaginava que lá na frente iria tornar-se um morador da vertical. E o que acontece hoje, é que já não sei morar em outra coisa, e casa com jardim e piscina foi um sonho do passado. Não devo negar que uma casa oferece mais espaço e uma melhor qualidade de vida, não nego também que é menos prático diante das dificuldades urbanas que vivemos. E a tendência, é ficar em espaços cada vez menores. Para quem vive de seus proventos, tem que inclinar-se ao sistema. Ele dita as regras, e em cidades de grande porte, todos são obrigados a viver engaiolados, e você não tem como fugir disso. O mercado cria toda uma infra-estrutura para lhe prender em suas amarras. Aí, o sonho daquela casa enorme que para o homem comum é quase um palácio, fica para poucos. A gente insiste em que as coisas sejam para todos, mas ainda o mundo é de poucos.
Já tem gente fugindo de casa de praia, porque o sistema quer que você vá para o Resort, que se torne sócio de um desses grupos integrados de Resorts, e pague uma boa oferta por uns dias de lazer. A indústria do lazer cresce a cada dia na terra e no mar. Os navios transatlânticos já concorrem com os hotéis. A indústria turística não quer lhe ver de fora de seus pacotes, e quer incluir cada vez mais consumidores deste produto.

Só sei que cada um tem seu perfil, e tem gente que não abre mão de investir no supérfluo quando pode. No domingo passado numa estrada praieira, uma camioneta importada, último modelo, passou por mim arrastando um jet-ski. Vinha, certamente, da casa de praia; percebia-se que era gente da classe média alta, um padrão de consumo bem definido na pirâmide social. As pessoas desse perfil têm seu charme, porém, quase sempre são fúteis e tediosas. Um jeito mais leve de encarar a vida, está nas pessoas que, contrariamente aquelas, são mais descomprometidas, ou excluídas desses padrões de consumo exagerado. E por isso, gozam de um melhor humor em virtude da vida mais simples. Para um franciscano, muita coisa pra carregar pesa. A vida é assim, cada um com seu fardo. Uns nascem pra ser ovelha, outros pra ser pastor. Uns nascem pra cantar, e outros pra compositor. Poucos são os capitalistas, e a grande maioria trabalhadores. Só sei que na nova era que se aproxima, os que muito consomem vão ter que repartir com os que querem consumir. Teremos que nos tornar de alguma forma, literalmente solidários; um pouco mais básicos para o planeta aguentar. Muito embora, os padrões de consumo ainda vão nos manter divididos em castas por um bom tempo, pelos mais e os menos favorecidos.
No fundo, todo ser humano busca a felicidade. Um dos segredos para encontrá-la, é ficar relaxado um pouco diante da vida, ao descobrir que a gente não precisa de muita coisa pra ser feliz.. A vida, em resumo, é trágica. Mas no decorrer da ilusão dos dias, a felicidade nos visita de diversas formas: seja quando estamos bem sucedidos, ou com uma vida simples e tranqüila; quando estamos bem casados, com lindos filhos; numa alegre festa com os amigos; numa viajem dos sonhos; com uma namorada apaixonante, e numa mesa bem posta. Entretanto, vez por outra ela se afasta, e aí, nos entregamos às agruras do sofrimento. Tornamos a esperá-la outra vez, e ela, cinicamente, essa tal felicidade, nos visita de novo. E você então vai somando os débitos e créditos que a vida lhe deu. E em determinado momento, você pode descobrir e dizer: entre os prós e contras da existência, sempre vale a pena viver. 

E como estava feliz hoje aquele cidadão de branco a conversar, sentado na poltrona ao lado no percurso  Recife – Maceió. Referia-se a chácara que adquiriu com vista para os lagos. Trata-se de uma casa de campo em nove hectares de área verde, onde ele estruturou para seu lazer particular. O que eu posso falar de sua felicidade? Que é um "vidão" sua chácara. Eu outro dia pude ver o que é um "vidão", quando visitei uma amiga no meio da tarde em sua boa casa, com um belo jardim, uma biblioteca e um pequeno acervo de antiguidades. No varandão cheio de plantas ao lado da piscina, conversávamos amenidades, na companhia de um bolo de ameixa bem caseiro com um suco de pitanga. Pude ver muitas flores, alguns passarinhos, uma arara e um tucano. Saí daquela casa de alma leve; e acho que vou voltar lá outra vez.

cronicjf@gmail.com

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Os ares de outono

20/03/2015 17:38

 

Neste dia sem sol de céu cinza chumbo, onde uma chuvinha constante caía de mansinho deixando a manhã molhada, só se ver mariposas voando. À noite, elas estavam nos postes em volta da luz, e algumas mais atrevidas a invadir nossas janelas; não sei se elas são tão ousadas em subir andares mais altos. Sobre os jardins e os telhados, e entre aqueles dois pés de jambo que se põe um em frente ao outro na rua, elas estavam a voar, a celebrar o seu grande momento em meio às gotas de chuva. Tão próximas, parecia nos dá bom dia; a nos mostrar naquele instante que o tempo mudou, assim como mudou a vida delas que antes estavam não sei onde, em algum casulo escondido talvez, invisíveis. E agora, nesta manhã chuvosa vem dizer que aqui também há outono, de forma sutil, mas há. E não é por total melancólico, nele também existe alegria expressa na efemeridade de um ciclo vital tão rápido. No entanto, me dão uma grande lição de como são oportunistas e sabem que esse é seu grande momento, e dão as caras pra nos dizer do novo ciclo da natureza, e que dentro da gente algo está acontecendo.

Você olha as coisas com uma vaga ponderação; abre aquele livro que você começou a ler e depois deixou pra lá; ouve aquele disco de Charles Aznavour, e fica mais reflexivo. E essas coisas vêm à tona como as mariposas aparecem no ar, de chofre, e sem avisar.
Quem sabe você não pense naquele amor que não se concretizou? Ou num lugar frio pros lados do sul do país?  Que esteve lá, e lembra daquela tarde quase sem sol, num prenúncio de inverno, em que sentou num banco próximo ao rio que cortava a cidade, enquanto olhava sem pressa a ponte e o casario. E ficou ali um tempinho bom, enquanto vinha a vontade de tomar um chocolate quente, e fumar um cigarro. E ainda com o cigarro entre os dedos, percebia que em suas entranhas havia um sentimento de que alguma coisa foi embora, e uma outra nova estava chegando. Sua percepção enxergava pequenas mudanças de atitudes; talvez estivesse mais sentimental, ao ponto de observar as coisas mais teluricamente.

Um bem-te-vi voava e agasalhava-se numa antena de TV, a cantar alto e achamar os outros parceiros. Aquele casal de rolinhas que logo cedo da manhã faz um city tur por aqui, juntamente com os pombos, os sanhaços, pardais e toda passarinhada, não os vi. Creio que eles hoje “tiraram o time”, porque o grande show ficou mesmo com as mariposas na rua e com os chuviscos. Então resolvo deixar a janela com certo dó.

Depois de ter dado uma “sacada” no tempo, recolho-me a pensar que tudo na vida tem seu lugar. E assim devo soltar minha alma como as folhas soltas ao vento, e deixar fluir o outono no coração. Porque daqui a uns tempos, como num passe de mágica esse período vai passar. E quando isso acontecer, eu não abrirei aquele livro do mesmo jeito que hoje, não ouvirei apaixonadamente uma música francesa, não esperarei o chuvisco passar para ir à padaria, e não buscarei o meu cantinho predileto com tanto prazer para ler o jornal. E nem ficarei assim, com essa melancolia amiga que me invade sem pedir licença; e sem que eu perceba, me faz um pouco mais sereno.

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Sargaços no mar

20/12/2014 09:06

 

Havia sargaços na areia, em meio a pegadas desertas que logo mais se apagariam com a subida da maré. Apagar-se-iam como a miragem de alguém que por ali passou, e deixou como um carimbo de seus pés, as marcas do seu caminhar na praia. E que o vento e as águas bravias não respeitarão, nem perguntarão de quem foram àqueles pés que ali pisaram, nem o que fizeram na praia, nem que destino tomou aquela trilha. Tudo nas ondas se funde num nada sem perguntas nem respostas. Como palavras escritas na areia, segue a vida a escrever seus dias na efemeridade das horas. E os sargaços melancólicos de serem desprezados pelo mar, servem agora de pouso as lavandeiras noturnas. E as invejam pela falta de mobilidade quando as vêem alegres a correr pra lá e pra cá, próximo as marolas; e as observam em seus vôos rasantes e em suas fugas para os coqueiros, onde acham ser abrigo seguro. Triste sina a dos sargaços, da sua solidão, nesta relação de amor e ódio com o mar que os põe pra fora, e depois os traga de volta as águas. Como os ironizasse pela falta de opção, por serem pisados e xingados por todos que não os enxergam, como verde vida nascida em águas limpas. E como filtros,  estas algas absorvem as agressões do meio ambiente, e resistem em proliferar-se.

Pus-me a caminhar na praia naquele começo de noite, até certo momento que me bateu fadiga. Na volta do percurso, ao passar defronte a colônia de pescadores, percebi reinar o silêncio do cansaço das jangadas. Já não havia por lá nem pescador nem peixe, não havia mais labuta nem a alegria da rede cheia, tão pouco o burburinho de gente a procura de um pescado fresco. Havia sim, àquela sensação de que o dia foi consumado, que a parte que compete àqueles homens do mar fora cumprida. Mas no breu da praia, entre os coqueiros, ainda havia velas soprando em jangadas altivas para o horizonte. E este é o sinal de que ainda haverá peixes, peixes de águas profundas e límpidas, porque ainda há plânctons, ainda há mar, e ainda há pescador.

Sentei-me na pedra em busca de algum conforto físico, procurando refazer-me do cansaço. Veio-me no pensamento o desespero de uma mãe ao celular por esses dias, lá no burburinho da cidade, preocupada com o comportamento de seu filho; coisa muito comum hoje em dia. Quando levantei os olhos pro vazio noturno, na pequena luz em frente ao bar, havia um jovem casal que brindava na água doses de caipirinha como se fosse champanhe. Tentavam segurar os copos no ar naquele reboliço das ondas. Por um momento, saíram da água, pegaram outra dose, e entraram no mar outra vez. Falavam alto, se abraçavam e bebericavam. No fundo, isso é o que impulsiona. E foram ficando ali; a mercê da brisa, das águas, e das areias dos sargaços.

cronicjf@gmail.com

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Primeira Edição © 2011