Refugiado no Brasil teve unhas arrancadas em sessões de tortura na Síria

Escuridão marca lembrança dos 20 dias de prisão de Samir Ahmad, que hoje tenta reconstruir vida com família em SP

19/07/2013 14:57

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Choques elétricos, chutes e socos foram a rotina de Samir Ahmad* durante o tempo em que ficou preso por participar das primeiras manifestações contra o regime do presidente da Síria, Bashar al-Assad, em Homs, cidade a oeste do país. Há nove meses no Brasil, o refugiado sírio usa frases sucintas para reconstruir os 20 dias em que diz ter ficado enclausurado, sem que sua família soubesse de seu paradeiro, em março de 2011: "Era tudo muito escuro", "Arrancaram minhas unhas" e "Queriam que eu dissesse que tinha sido pago para participar dos protestos".

O relato de Samir Ahmad se assemelha a 200 outros registrados pela organização Human Rights Watch (HRW) em relatório sobre o chamado "arquipélago de tortura" na Síria, divulgado no ano passado. Segundo a HRW, desde março de 2011, autoridades sírias submeteram "dezenas de milhares a prisões arbitrárias, detenções ilegais, desaparecimentos forçados, maus-tratos e tortura usando uma extensa rede de centros de detenção".

A organização afirmou que foram identificados mais de 20 métodos de tortura diferentes empregados por interrogadores, guardas e oficiais do país, incluindo abusos sexuais, simulação de execução, extração de unhas e uso de choques elétricos.

Aos 28 anos, Ahmad teve sua vida alterada em um piscar de olhos. Em março de 2011, ele participava com amigos de um protesto contra o governo pela terceira vez, quando forças de segurança do governo reprimiram o ato com violência. Ahmad apanhou, teve seus olhos vendados e foi levado pelos agentes para um prédio oficial. E foi com os olhos cobertos que pemaneceu a maior parte do tempo durante as mais de duas semanas que se seguiram.

Preso em local que desconhecia, Ahmad recebia um pedaço de pão e de queijo todos os dias, o mínimo para mantê-lo de pé e aguentar as sessões diárias de interrogatórios sob tortura, que, segundo relembrou, duravam em média duas horas. "Os oficiais ( do regime ) tinham muitos motivos para me torturar. Primeiro, para eu não voltar a me manifestar. Também para intimidar meus amigos", disse.

Enquanto isso, seu pai tentava desesperadamente encontrá-lo. Foi um funcionário do governo que, por meio de propina, descobriu o paradeiro de Ahmad e avisou sua família. Depois do pagamento de US$ 10 mil "por fora", Ahmad estava livre novamente, mas sua vida fora da cela não representou um alívio. Por causa do nome "sujo", ele não poderia correr o risco de ser parado pelos postos de controle do regime espalhados por toda a cidade, então, teve de se submeter a uma nova prisão, dessa vez dentro de sua própria casa, até que conseguisse regularizar sua situação.

Primeira Edição © 2011