Mudanças no Enade começam a valer este ano, confirma Mercadante

Enade passa a ser obrigatório também para alunos do penúltimo semestre da graduação

14/03/2012 15:24

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Estadão

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O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, informou nesta quarta-feira que as mudanças nas regras do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) já valem para a edição deste ano. O Enade era obrigatório somente para os alunos concluintes de cursos superiores, mas agora avaliará também os estudantes do penúltimo semestre da graduação.

“Isso resolve o problema que nós identificamos de postergar a formatura do aluno por um semestre, intencionalmente ou não, para poder eventualmente melhorar o desempenho no Enade. Nós queremos que todos eles façam a prova para que a gente tenha a verdadeira avaliação da instituição”, disse o ministro.

A decisão vem após a divulgação de denúncias, encaminhadas ao MEC, de que a Universidade Paulista (Unip) seleciona alunos para ter melhores notas no Enade, carro-chefe de uma agressiva campanha de marketing. O ministério pediu explicações à Unip, que nega qualquer tipo de manobra ou irregularidade na inscrição dos estudantes.

Segundo Mercadante, as novas regras do Enade serão publicadas no Diário Oficial da União de amanhã, dia 15.

Histórico


Em 2 de março, o Estadão.edu revelou que o MEC cobrou da Unip explicações sobre indícios de irregularidades nas notas do Enade. O ministério tomou a medida com base num relatório enviado ao presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Luiz Cláudio Costa, que acusava a universidade de “esconder” seus alunos com notas mais baixas, para que não façam o Enade.

A universidade entregou ontem ao MEC os dados pedidos. A vice-reitora, Marília Ancona Lopez, negou que a Unip faça seleção de alunos, mas admitiu que a universidade aumentou a reprovação de alunos nos anos anteriores ao Enade, algo que o MEC quer desestimular com o pacote. “Criamos um processo de melhoria da qualidade do ensino. Mas, como não dá para mudar todos os cursos ao mesmo tempo, num primeiro momento decidimos trabalhar seguindo o calendário do Enade”, disse. “Tivemos o caso de um curso de Direito da capital em que 200 alunos saíram para uma instituição concorrente.”

Diversos professores, ex-alunos e um ex-funcionário da Unip confirmaram ao Estadão.edu que a universidade formou estudantes que prestaram o Enade juntamente com outros que não fizeram o exame. Segundo denúncias enviadas à reportagem, a Unip tem um mecanismo, o regime de progressão tutelada, que permite atribuir notas quando o coordenador do curso achar conveniente.

“Os alunos são selecionados durante o curso e, no 5.º e 6.º semestres, são ‘reprovados’ e colocados num ‘limbo’, chamado de ‘turma tutelada’. Após o Enade, eles voltam a aparecer e concluem o curso rapidamente”, disse uma das fontes. Com a nota em aberto, o aluno não cumpre a carga horária de 80% do curso exigida para prestar o Enade.

Na Unip, para passar para o 2.º semestre, o aluno pode ficar de dependência em um número ilimitado de disciplinas. Nos semestres seguintes, só pode ficar de DP em 5 disciplinas. À medida que o curso se aproxima do fim, o limite cai para 3. No penúltimo semestre, só passa quem não teve nenhuma DP. A quem supera o limite de DPs, a Unip oferece a opção da turma tutelada, na qual não cobra pelas DPs.

“Ele será matriculado provisoriamente no período seguinte do seu curso”, explicou um coordenador em e-mail enviado a professores. "Vai para o período seguinte, mas só faz as DPs que a Unip determinar. Neste caso, o aluno fica na condição de tutelado até o final do curso.”

Documentação


O Estadão.edu teve acesso a outros e-mails de coordenadores. Em agosto, época da inscrição para o Enade, um deles respondeu a alunos que a nota só estaria disponível no dia 15 de dezembro, depois da realização do exame, que normalmente ocorre em novembro.

A atribuição de notas só em dezembro pode explicar casos como o de um ex-aluno de Direito que prestou o Enade em novembro de 2009. "Na classe, mais de 25 alunos se formaram, mas só eu e mais 4 fizemos o Enade."

No curso de Odontologia de Campinas, por exemplo, só cinco alunos prestaram o Enade 2010. Tiveram nota média de 4,79 - a máxima é 5. O curso passou a ser considerado o melhor do Brasil, superando universidades estaduais e federais.

Variação


O Estadão.edu também teve acesso à variação da nota média de faculdades e universidades de todo o País nos Enades de 2007 a 2010 em cinco cursos da saúde. No curso de Nutrição, por exemplo, a nota da Unip subiu 207% do Enade de 2007 para o de 2010, muito acima da melhora na média nacional, de 25%. Mas o número de inscritos da Unip no Enade despencou 79,5%, de 283 para 58.

Em Enfermagem, a melhora das notas foi de 3,7% na média nacional e de 107,94% na Unip. Em Farmácia, a nota média nacional subiu 34,2%; a da Unip subiu 149,6%. Em Fisioterapia, houve queda no desempenho médio no País, de 13,4%. O da Unip, porém, melhorou bem: 54,7%.

Em Odontologia, também houve queda na nota do conjunto das faculdades e universidades, de 2,67%. Novamente a Unip destoou das demais: sua nota subiu 49,5%.

Em 2007, a melhor unidade de Enfermagem da Unip no Enade ficou na 150.ª posição. Três anos depois, passou a liderar o ranking do setor.

A mesma coisa acontece com os outros cursos da Saúde. Em Nutrição, a Unip não teve em 2007 nenhuma unidade entre as notas top figurou entre os 20% de melhor desempenho. Em 2010, 16 dos 17 cursos de Nutrição da Unip ficaram no grupo de ponta.

Outro lado


A Unip afirmou em nota que os resultados no Enade "decorrem das medidas que são continuamente tomadas pela universidade para qualificar cada vez mais os seus cursos". Entre essas medidas, a Unip cita a atualização de programas, revisão de bibliografias, acompanhamento das avaliações, produção de material didático, investimento nos laboratórios e infraestrutura, utilização de novos recursos didáticos e capacitação de professores.

Quanto à turma tutelada, a Unip afirmou em outra nota que o sistema nasceu com base em demandas do Diretório Central de Estudantes, que considerava muito alto o valor pago pelas DPs. “O DCE solicitou, ainda, que os alunos pudessem cursar as DPs em um prazo maior. No caso do aluno não conseguir eliminar todas até o antepenúltimo período, a universidade prolonga a duração do curso e as DPs não são cobradas.”

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