Cunha e Collor devem ser novamente denunciados

Procurador-geral já estabeleceu novas frentes de atuação na Lava-Jato

28/08/2015 06:47

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Vinicius Sassine - O Globo

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Reconduzido para mais dois anos à frente da Procuradoria-Geral da República (PGR), depois de uma aprovação com folga no Senado, Rodrigo Janot já estabeleceu as novas frentes de atuação na Lava-Jato. A PGR planeja um segundo inquérito para investigar outras suspeitas relativas ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já denunciado ao Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O grupo de trabalho que auxilia o procurador-geral também suspeita que o senador Fernando Collor (PTB-AL) cometeu outros crimes — além de corrupção passiva, peculato e crime contra a lei de licitações já denunciados ao STF —, e passou a investigá-los no inquérito ainda em andamento. E novas denúncias contra políticos com foro privilegiado estão previstas para o próximo mês.

Além disso, a quantidade de inquéritos abertos para investigar autoridades com foro vai aumentar nos próximos dias. Janot enviou ao STF novos pedidos de abertura de inquérito, com base na delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da construtora UTC e apontado como o chefe do cartel que fatiou contratos na Petrobras e em outras estatais. O ministro Teori Zavascki, relator do caso no STF, está prestes a decidir sobre os pedidos.
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Atualmente, estão em andamento no STF procedimentos que investigam 13 senadores, 22 deputados e 12 ex-deputados citados na Lava-Jato. Entre eles está o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). As investigações sobre Renan têm “andamento regular”, segundo fontes ouvidas pelo GLOBO.

Collor e Cunha foram os primeiros parlamentares denunciados pelo procurador-geral ao STF, no último dia 20. A denúncia contra Collor, com mais de 200 páginas, usou apenas uma parte das provas colhidas no curso do inquérito. A acusação foi transformada em processo no STF, e o inquérito original continua tramitando, em paralelo, com uma apuração que ultrapassa as suspeitas de corrupção. A situação de Cunha é semelhante. Fontes da Procuradoria afirmam ser provável a abertura de novo inquérito, para apurar fatos que ficaram de fora da denúncia principal.

Novas denúncias contra outros políticos estão previstas para ocorrer em um mês. Durante a sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, anteontem, Janot revelou fazer uma “marcação” sobre o estágio da colheita de provas nas investigações, classificando cada etapa de muito ruim, ruim, regular, boa e ótima. O estágio “ótimo” sinaliza que o caso está pronto para a acusação formal no STF.

PARA PROCURADORES, HÁ PROVAS

A interpretação de fontes com acesso às investigações é de que a denúncia contra Cunha — acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro — está bem amarrada, com provas suficientes para aceitação pelo plenário do STF e para condenação, sem necessidade de aditamentos. O presidente da Câmara foi acusado de receber propina a partir de contratos de aluguel de navios-sonda firmados entre a Petrobras e a empresa Samsung Heavy Industries, com a intermediação do operador Fernando Baiano, preso em Curitiba. Janot pediu a devolução de US$ 80 milhões aos cofres públicos.

O fato de não haver a comprovação do destino final da propina distribuída por Baiano não é um problema para a acusação, na avaliação dos procuradores, porque a denúncia deixa configurado que Cunha “solicitou” propina — e só o ato de “solicitar”, mesmo sem eventualmente “receber”, configura o crime de corrupção.

A denúncia descreve com minúcias a reunião que teria ocorrido entre Cunha, Baiano e o lobista Júlio Camargo (delator da suposta participação do deputado no esquema), em 2011, no Rio. O encontro teria servido para acertar o pagamento de resíduos de propina, conforme a acusação, e somente esse episódio já seria suficiente para uma condenação de “seis a sete anos de prisão”, conforme investigadores.

A delação de Baiano, em negociação pelo Ministério Público Federal (MPF), não é interpretada como fundamental para os fatos relacionados a Cunha. A investigação é comparada com a do mensalão, quando teriam sido reunidas menos provas que as contidas na denúncia contra o presidente da Câmara. Os integrantes dos núcleos político, financeiro e publicitário foram condenados à prisão, entre eles o ex-ministro José Dirceu.

Cunha já foi notificado para apresentar defesa. Ele vem dizendo que não há provas contra ele, que a denúncia se baseou apenas na delação de Camargo, e que não há razão para seu afastamento do cargo. Ontem, num café da manhã com ministros do Tribunal de Contas da União (TCU), o deputado criticou reservadamente a acusação.

— A tendência é se agravar esse torneio de denúncias — relatou Cunha aos ministros, segundo O GLOBO apurou.

Cunha disse ainda aos ministros do TCU que a delação usada contra ele foi homologada apenas na Justiça Federal. E afirmou que o depoimento de Camargo acabou sendo “vazado” em Curitiba, o que o teria prejudicado. Participaram do café da manhã o presidente do TCU, Aroldo Cedraz, e mais quatro ministros. Cedraz foi quem pediu o encontro.

Depois da denúncia ao STF, Cunha tem adotado uma postura mais cautelosa em relação ao procurador-geral. A posição é diferente da assumida por Collor. Em discursos, o senador já chamou Janot de “fascista” e “filho da puta”.

Na sabatina anteontem, Collor voltou a sussurrar o xingamento, segundo testemunhas. O senador ficou frente a frente com Janot nas primeiras três horas da sabatina e fez diversas acusações, refutadas pelo procurador. A recondução ao cargo de procurador-geral em plenário foi aprovada por 59 votos a 12.


 

Primeira Edição © 2011