No centro de Maceió, sanfoneiros mostram a sua paixão pela música

Com uma sanfona a sorrir, acordeonistas transformam "A Casa do Forrozeiro" em um recanto de histórias e musicalidade

03/03/2015 10:55

A- A+

Uadson Barros - Estagiário*

compartilhar:

Puxa o fole, sanfoneiro! Do baião ao xote, do pé-de-serra ao forró atual, os sons que ecoam das sanfonas transcendem gerações e se fazem presentes até hoje na vida das pessoas que se dedicam a tocar esse instrumento símbolo da cultura nordestina. Consagradas nas mãos de grandes músicos brasileiros, como por exemplo, Luiz Gonzaga e Dominguinhos, a arte de ‘sanfonar’ segue sendo a paixão incondicional na vida de gente simples e que vê na música uma forma de contar as suas histórias e alegrias.

No início do século XX, imigrantes alemães e italianos que chegavam ao Brasil pela região Sudeste, mais precisamente por São Paulo e Rio Grande do Sul, traziam consigo as famosas e belíssimas sanfonas. À época, agricultores realizavam festas ao som do acordeom como forma de representação das tradições locais. Com o passar dos anos, o instrumento foi adquirindo características regionais e, consequentemente, diferentes nomes. Mas foi aqui no Nordeste, por meio do ‘Rei do Baião’, Luiz Gonzaga, que os sons que ecoam das sanfonas se popularizaram e contribuíram para a divulgação e o crescimento da cultura regional.

SANFONEIRO ARRETADO

E é em um cantinho aconchegante e encantador, que forrozeiros de Maceió e de algumas regiões de Alagoas se reúnem para tocar um bom forró pé-de-serra e colocar em dia as grandes novidades deste ritmo contagiante e tão presente na cultura do povo nordestino. Localizada na Rua das Árvores, no centro de Maceió, a pequena loja comercial, mais conhecida como A Casa do Forrozeiro, é o reduto de Arnaldo Vieira, (59), ou ‘Naldo do Baião’, como prefere ser chamado, e que há 45 anos faz história mostrando a arte e a sua paixão pela sanfona.

Natural de Palmeira dos Índios, interior do estado, e há 43 anos morando na capital alagoana, Naldo do Baião diz que o talento para a sanfona foi herdado dos pais e que desde pequenininho aprendeu a tocar o seu primeiro instrumento. “Desde muito jovem tomei gosto pela música. Sempre gostei do barulho do acordeom. Aos treze anos, aprendi a tocar a minha primeira sanfona, logo a de 80 baixos. E logicamente, a primeira música que aprendi foi ‘Asa Branca’, do Luiz Gonzaga, quem eu admiro muito”, relata.

 

Uadson Barros/Primeira Edição

Com o avanço da tecnologia, as sanfonas também se modernizaram. Com preços variando entre R$ 800 a 25 mil reais, esses instrumentos podem ser considerados como verdadeiras obras de arte. Mas não basta ter uma bela sanfona. De acordo com Arnaldo, é preciso muita prática e dedicação para aprender a dedilhar essa caixa musical. “São necessários em média uns oito meses de muita dedicação para aprender a tocar o acordeom. Agora, para passar de tocador a sanfoneiro, desses arretados mesmo, que animam bailes e forrós, é preciso mais de ano, e muito talento, o que é fundamental nessa hora e que acaba contando muito na vida de um puxador de fole”, afirma.

DIFICULDADES NO RAMO

Mesmo estando presente de forma intrínseca na cultura dos nordestinos, a sanfona vem sofrendo com a escassez de pessoas que se dediquem a dedilhar esse belíssimo e complexo instrumento. Com a falta de investimentos e projetos que incentivem e privilegiem a classe sanfoneira em Maceió, os adeptos a essa modalidade acabam optando por outros meios para conseguirem sobreviver no ramo da arte musical. As casas de forró na cidade são pouquíssimas, as rádios que exibem programas de forró estão dando espaço a outras programações e os puxadores de fole estão perdendo cada vez mais o seu espaço para bandas nacionalmente privilegiadas.

Apesar da paixão pela sanfona, acordeonistas sentem-se tristes pelo desestímulo dos jovens em aprender a tocar um dos símbolos da cultura regional. A preferência pelo que há de mais moderno acaba sendo priorizado e as sanfonas, muitas vezes, acabam se tornando desconhecidas por parte da garotada imersa no mundo tecnológico.

“Aqui na cidade, a gente tem em média umas quatro casas de forró que funcionam aos finais de semana. O Forró do Louro, perto da Bomba do Gonzaga, o Forró do Cortiço, no Benedito Bentes II, Toca do Gaúcho, no Jacintinho e o Forró Mandacaru, na Colina. Antigamente tínhamos um forró bem arretado no Lampião, onde os turistas iam nos ver tocar e se divertirem ao som do forró pé-de-serra. Mas o lugar fechou e hoje em dia são poucos os locais que temos para divulgar a nossa música. Antes nós sanfoneiros tínhamos até convites para irmos às rádios e fazermos um programa diferente, mas hoje em dia, posso contar nos dedos as rádios que exibem programas com artistas de forró. Para sobrevivermos só da música não dá. No fim,, acabamos buscando outras fontes de renda para viver”, disse Naldo do Baião.

E SEGUE A ARTE

Muitas vezes uma companheira de vida, que embala histórias e traduz sentimentos através dos seus sons, as sanfonas podem ser consideradas as deusas da música para o povo nordestino. Aos amantes, a paixão pelo acordeom segue. Com a cultura passada de pai para filho e da sonoridade ecoada, o que se sabe é que sempre haverá um sanfoneiro puxando o seu fole.

Primeira Edição © 2011