Corpo de Niemeyer é enterrado no Rio

07/12/2012 15:16

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G1

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O corpo do arquiteto Oscar Niemeyer foi enterrado às 17h59 desta sexta-feira (7), no Cemitério São João Batista, em Botafogo, na Zona Sul do Rio, sob aplausos e ao ritmo de samba. Integrantes da Banda de Ipanema tocaram "Carinhoso" durante o cortejo. O arquiteto morreu às 21h55 de quarta-feira (5), aos 104 anos, em decorrência de uma infecção respiratória, no Hospital Samaritano, no mesmo bairro. Ele completaria 105 anos no próximo dia 15, e estava internado havia pouco mais de um mês.

O corpo foi levado pela Guarda de Honra da Guarda Municipal, com aparato da Polícia Militar que fez um cordão de isolamento para que não houvesse aproximação das pessoas ao caixão. Durante o enterro, algumas pessoas fizeram saudação ao fato de Niemeyer ter sido comunista. Depois que a sepultura foi fechada, a Banda de Ipanema tocou "Cidade Maravilhosa" e "Aquarela Brasileira".

Carlos Niemeyer, neto do arquiteto, falou do jeito simples de Oscar Niemeyer ao agradecer as manifestações de carinho recebidas tanto de autoridades como de anônimos. "A vida toda ele foi bom com as pessoas, foi generoso, se preocupava com as diferenças sociais. Ele atendia todo mundo", afirmou. "Uma pessoa chegou hoje ao velório e aí disseram: 'mas quem é essa pessoa?'. Eu disse: 'o Oscar gostaria de atender do mendigo ao presidente da república. Então se essa pessoa quiser vir fazer essa última homenagem, ele vai gostar é disso. Isso é o que justifica a quantidade de gente homenageando o meu avô", completou.

O velório aberto do arquiteto no Rio começou às 8h30 desta sexta, no Palácio da Cidade, também em Botafogo. A viúva Vera, o sobrinho Paulo, e o neto Carlos Oscar Niemeyer foram os primeiros a chegar. Pouco antes de os portões serem abertos, o governador Sérgio Cabral, o vice Luiz Fernando Pezão e o prefeito Eduardo Paes entraram para uma breve cerimônia ao lado de familiares. Em seguida, centenas de pessoas começaram a entrar. O caixão, coberto com uma bandeira do Brasil, ficou fechado e o rosto do arquiteto podia ser visto através de um vidro.

Uma cerimônia ecumênica foi celebrada com corpo presente antes do cortejo em direção ao Cemitério São João Batista. "Pela primeira vez um rabino, dois padres católicos e um pastor luterano fazem uma celebração ecumênica pela alma de um ateu comunista. A fé remove montanhas", disse o pastor Mozart Noronha, que ainda cantou a música "Cântico ao pescador", de Dorival Caymmi, sendo acompanhado pelos presentes, como o padre Jorjão e o rabino Nilton Bonder.

Entre os fãs que foram ao local para prestar homenagem ao arquiteto, o pequeno Richard Lourenço Dias, de apenas 6 anos, ganhou destaque nas fotos que rodaram o mundo. "Minha construção preferida é o sambódromo", contou o menino.

Das diversas coroas de flores recebidas pela família, há uma enviada em nome do líder comunista cubano Fidel Castro, direcionada "ao incondicional amigo de Cuba Oscar Niemeyer".

O poeta Ferreira Gullar lamentou a morte do amigo. "Vim me despedir do Oscar. É uma perda incalculável para o país e para a arquitetura mundial. Ele tinha uma arquitetura poética. Introduziu não só a forma curva, mas também a leveza. Os prédios parecem flutuar. Para nós, amigos, é uma dor irreparável."

Luís Carlos Prestes Filho, presente ao lado da mãe, Maria Prestes, lembrou a amizade do arquiteto com seu pai. "Papai e Oscar Niemeyer foram os grandes comunistas do Brasil. A população não perde apenas um grande artista, mas também um grande homem. Sempre foi muito solidário com papai."

Outros que passaram pelo velório foram o jornalista Merval Pereira, o escritor Zuenir Ventura, o cartunista Ziraldo, o arquiteto Paulo Casé e os políticos Jaime Lerner, também arquiteto e ex-governador do Paraná; Antônio Anastasia, governador de Minas Gerais; e Márcio Lacerda, prefeito de Belo Horizonte.

'Um ser humano inigualável'
"Foi um homem perfeito, um ser humano inigualável. Isso está na boca de todo mundo. Ele foi aplaudido pelo povo. Ele encantou o mundo todo", disse Jaime Lerner.

O corpo do arquiteto voltou ao Rio na noite desta quinta-feira (6), após um primeiro velório em Brasília. De acordo com o Terceiro Comando da Força Aérea Regional, o corpo chegou ao Aeroporto Santos Dumont às 22h08 e, em seguida, foi levado para o Palácio da Cidade, onde chegou às 22h35.

A estudante de arquitetura Gisela Aguiar foi a primeira a chegar na fila para o velório no Rio. Nascida em Brasília e moradora do Rio, ela contou que sempre admirou as obras de Niemeyer.

"Ele fez aquelas edificações belíssimas em Brasília. E esta é uma forma de prestar uma homenagem a ele. Todos os professores admiram a obra dele e falam que a Catedral da capital federal e o Palácio do Planalto são lindos", contou a moradora do Flamengo.

Lembranças do neto
O neto Carlos Oscar Niemeyer contou que trabalhou com o avô durante 13 anos e lembrou dos ensinamentos que recebeu.

"Eu trabalhei com o Oscar durante 13 anos e aprendi com ele três coisas importantes. Ele dizia a vida é um segundo, isso quer dizer que a gente tem que viver uma vida bem vivida; falava também que o mundo é injusto, temos que modificá-lo; e que a palavra mais bonita é solidariedade", ressaltou o neto, acrescentando que "o Oscar teve uma vida de trabalho, de amizades, fazendo só coisas boas, então acho é normal que ele seja uma pessoa querida. Lá em Brasília estava todo mundo emocionado", concluiu Carlos Oscar.

Velório em Brasília
Na quinta-feira à tarde, em Brasília, segundo estimativa da Polícia Militar (PM) do Distrito Federal, 3,8 mil pessoas, em fila, passaram pelo Salão Nobre do Palácio do Planalto nas três horas e 45 minutos de velório.

A previsão era que o velório se encerrrasse por volta das 21h, mas a familia decidiu antecipar a volta ao Rio. Cerca de cem pessoas que aguardavam a passagem do caixão do lado de fora do palácio cantaram o Hino Nacional em homenagem a Niemeyer.

No Planalto, Dilma e a viúva de Niemeyer foram as primeiras a se aproximar para observar o corpo. A tampa do caixão não foi retirada. Apenas uma abertura de acrílico permitia que se visualizasse a face do arquiteto.

O vice-presidente da República, Michel Temer, e os presidentes do Senado, José Sarney, da Câmara dos Deputados, Marco Maia, e do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, também foram se despedir de Niemeyer. Temer fez o sinal da cruz ao se aproximar do caixão.

Em seguida, se formou uma fila de autoridades no salão nobre do Planalto para prestar a última homenagem ao arquiteto famoso. A presidente Dilma se manteve o tempo todo, em pé, ao lado da cadeira onde estava sentada a viúva de Niemeyer.

Ministros de Estado, parlamentares, governadores e prefeitos que compareceram ao velório cumprimentaram Vera Lúcia e manifestaram palavras de apoio.

Por volta das 16h15, Dilma pediu que seu chefe de gabinete conduzisse a viúva ao terceiro andar do palácio, onde fica o gabinete presidencial. Em seguida, a própria presidente deixou o salão acompanhada da chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann.

O velório de Niemeyer é o terceiro realizado no Salão Nobre do Palácio do Planalto. O primeiro foi o do ex-presidente Tancredo Neves, em 1985. O segundo foi o do ex-vice-presidente José Alencar, no ano passado.

Luto oficial
Nesta quinta, Dilma Rousseff decretou luto oficial de sete dias. O decreto foi publicado no "Diário Oficial da União" nesta sexta. Durante o período de luto, a bandeira nacional deve ser hasteada em meio mastro em todas as repartições públicas, estabelecimentos de ensino e sindicatos.

A lei prevê que, no caso de morte de autoridades civis ou militares, o governo pode decretar luto de, no máximo, três dias. A lei prevê, porém, que "em face de notáveis e relevantes serviços prestados ao país" pela pessoa falecida, o período de luto poderá ser estendido até, no máximo, sete dias.

Cortejo
O corpo de Oscar Niemeyer chegou a Brasília às 14h18 desta quinta-feira (6), trazido do Rio de Janeiro em um avião da Presidência da República, e seguiu em cortejo em carro aberto até o Palácio do Planalto, passando pelo Eixão Sul e pela Esplanada dos Ministérios, onde estão as principais obras do arquiteto na capital do país.

Palácio do Planalto
O velório de Niemeyer ocorreu Palácio do Planalto, projetado pelo próprio arquiteto, por iniciativa da presidente Dilma Rousseff, que fez a oferta à família.

No prédio, inaugurado em 21 de abril de 1960, fica o gabinete da presidente Dilma Rousseff. A construção começou em 10 de julho de 1958.

A inauguração do palácio ocorreu em 21 de abril de 1960, como parte das festividades da inauguração de Brasília e marca a história brasileira por simbolizar a transferência da capital federal para o centro do País, no governo de Juscelino Kubitschek.

'Só falava em viver'
O médico Fernando Gjorup disse, na noite de quarta-feira, que Oscar Niemeyer conversou com a equipe médica sobre a vontade de realizar novos projetos, mesmo aos 104 anos. Segundo ele, o arquiteto só perdeu a consciência pela manhã, após ser sedado. O médico, que cuidou dele por 15 anos, afirmou que Niemeyer pouco falava sobre a saúde.

"Antes dessa internação, ele chegou a conversar com a equipe sobre novos projetos. Ele não gostava de falar sobre a saúde dele, mas sabia que já tinha passado da metade da vida. Ele nunca falou sobre morte, só falava em viver. A equipe médica tinha esperança, mas havia a fragilidade de um senhor de 104 anos", disse Gjorup.

Segundo a equipe médica, o arquiteto apresentou piora progressiva nos últimos dois dias. O arquiteto era submetido a hemodiálise e seu estado imunológico já era deficiente. Cerca de 10 familiares estavam na Unidade Coronariana do hospital quando Niemeyer morreu.

Repercussão
Em nota, a presidente Dilma Rousseff lamentou a morte de Niemeyer e disse que "poucos sonharam tão intensamente e fizeram tantas coisas acontecer como ele". "Niemeyer foi um revolucionário, o mentor de uma nova arquitetura, bonita, lógica e, como ele mesmo definia, inventiva". O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em nota divulgada pelo Instituto Lula, afirmou que Niemeyer "ficará sempre entre nós, presente nas linhas dos edifícios que plantou no Brasil e em todo o mundo".

Dezenas de outros políticos, arquitetos, artistas, apresentadores, jornalistas e personalidades brasileiras se manifestaram sobre a morte de Oscar Niemeyer. (Leia o que familiares, amigos e famosos disseram sobre o arquiteto.)

Histórico de internações
O arquiteto foi internado várias vezes ao longo dos últimos anos. Em 2006, ele teve de ficar no hospital por 11 dias após sofrer uma queda e passar por uma cirurgia.

Em 2009, ficou internado por 24 dias no Hospital Samaritano, entre setembro e outubro, após sentir dores abdominais. Ele chegou a passar por uma cirurgia para retirar um tumor no intestino grosso, uma semana depois de ter sido operado para a retirada de um cálculo na vesícula.

Em junho do mesmo ano, o arquiteto foi internado no hospital Cardiotrauma de Ipanema, também na Zona Sul, queixando-se de dores lombares. Ele passou por uma bateria de exames e recebeu alta médica algumas horas depois. Na ocasião, exames de sangue e uma tomografia indicaram que Niemeyer estava apenas com uma lombalgia.

Em 2010, Niemeyer também foi internado em abril, devido a uma infecção urinária.

Em abril de 2011, o arquiteto ficou internado por 12 dias por causa de infecção urinária. Também já foi submetido a cirurgias para a retirada da vesícula e de um tumor no intestino.

Em maio deste ano, Niemeyer também esteve internado, quando deu entrada com desidratação e pneumonia. Depois de 16 dias, com passagem pela UTI, recebeu alta.

No dia 13 de outubro, o arquiteto deu entrada no Hospital Samaritano após sentir-se mal, apresentando um quadro de desidratação. Ele ficou internado por duas semanas.

A última internação foi em 2 de novembro, quando voltou ao Samaritano, seis dias depois de ter recebido alta. Desta vez, Niemeyer foi submetido a tratamento de hemodiálise e fisioterapia respiratória.

Trabalho para festejar 104 anos
Autor de mais de 600 projetos arquitetônicos, Niemeyer decidiu festejar os seus 104 anos do jeito que mais gostava: trabalhando em seu ateliê de janelas amplas diante da Praia de Copacabana, na Zona Sul do Rio.

Em agosto de 2011, ele lançou o livro "As igrejas de Oscar Niemeyer" (Editora Nosso Caminho), na galeria de um shopping da Zona Sul do Rio.

Embora ateu convicto, o arquiteto selecionou fotos e desenhos das 16 obras religiosas, entre capelas e igrejas, que realizou ao longo de sua carreira.

"As pessoas se espantam pelo fato de, mesmo sendo comunista, me interessar pelas igrejas. E a coisa é tão natural. Eu morava com meus avós, que eram religiosos. Tinha até missa na minha casa. E eu fui criado num clima assim. Esse passado junto da família me deixou com a ideia de que os católicos são bons, que querem melhorar a vida e fazer um mundo melhor", explicou na ocasião.
Destaque na arquitetura mundial

Niemeyer foi um dos arquitetos mais premiados e influentes do mundo. Seu trabalho, sempre cheio de curvas em concreto que tornavam seu estilo inconfundível, marcou a paisagem urbana do Brasil e de outros países.

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Primeira Edição © 2011