Em 10 anos, Estados e municípios deixam de usar R$ 160 milhões em programas de combate à Aids

11/11/2012 08:55

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UOL

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Estados e municípios de todas as regiões do país deixaram de usar, ao todo, R$ 160 milhões repassados pelo Ministério da Saúde para programas de tratamento e prevenção da Aids. Os recursos, transferidos pelo ministério a cada quatro meses desde 2003, são “carimbados”, isto é, não podem ser utilizados em outras áreas da saúde.

Segundo a última contabilização do ministério, desde 2003 foram transferidos R$ 1,03 bilhão aos Estados e municípios. Do total, R$ 161 milhões, o que representa 15,6%, não foram usados e estão parados.

De acordo com dados do Ministério da Saúde, entre 1980 e junho de 2011, foram registrados 608.230 casos de portadores do vírus HIV no Brasil. A taxa de incidência permanece estável desde 1998, com 20 infectados para cada 100 mil habitantes.

Embora a incidência tenha se reduzido no Sudeste --região que concentra 56% dos infectados-- entre 1980 e 2011, caindo de 24,5 para 17,6 casos a cada 100 mil pessoas, nas demais regiões subiu: de 27,1 para 28,8 no Sul; 7 para 20,6 no Norte; 13,9 para 15,7 no Centro-Oeste; e 7,1 para 12,6 no Nordeste.

A cada ano, mais de 11 mil soropositivos morrem no Brasil, média de uma morte a cada 45 minutos. Desde 1998, o número de mortes por Aids no Brasil mantém-se estável, enquanto no mundo todo caiu, em média, 24% entre 2005 e 2011.

Destino dos recursos
A distribuição dos recursos para o combate à Aids foi criada a partir de uma da portaria do Ministério da Saúde, de dezembro de 2012, assinada pelo ministro Barjas Negri. O objetivo era descentralizar a aplicação dos recursos e melhorar a eficiência do SUS (Sistema Único de Saúde) no tratamento da doença.

A partir de outubro deste ano, a Comissão Intergestora Tripartite do SUS, que reúne 21 representantes do Ministério da Saúde, Estados e municípios, passou a discutir o que fazer com o dinheiro que não foi usado.

No último dia 18, a comissão chegou a publicar, na página do Ministério da Saúde, a minuta de uma portaria que, se entrasse em vigor, liberaria os Estados e municípios para usar os recursos da maneira que preferissem. Após a decisão ser questionada por entidades que atuam no enfrentamento à Aids, a minuta da portaria foi retirada do site.

Procurada pela reportagem do UOL, a assessoria de comunicação do Ministério da Saúde afirmou que a minuta não tinha nenhuma validade e que a aplicação dos R$ 160 milhões vai ser definida até o final de novembro. Ainda de acordo com a pasta, o montante não será utilizado em outras áreas.

Na semana passada, foi criado um Grupo de Trabalho, composto por organizações não-governamentais e representantes dos três entes da federação, que terá como tarefa fazer sugestões à Comissão Intergestora Tripartite.

Segundo o psicólogo Veriano Terto Júnior, coordenador-geral da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), a comissão comprometeu-se a manter os repasses e a exigir que os recursos sejam aplicados somente em políticas ligadas à Aids. “Uma nova portaria será decidida até 22 de novembro. As políticas de incentivo serão mantidas”, afirmou.

“É fundamental que os recursos sejam gastos integralmente em políticas contra a Aids. Não tem cabimento retirar esses recursos em um momento em que o mundo inteiro diz que é preciso controlar a Aids”, afirma Alessandra Nilo, coordenadora da ONG Gesto, que trabalha com o tema.

Em nota redigida após a publicação da minuta da portaria, Pedro Chequer, coordenador do Unaids --programa da ONU (Organização das Nações Unidas) para Aids no Brasil--, criticou a não aplicação dos recursos. “De modo algum entendemos como aceitável, do ponto de vista ético, a existência de recursos sem utilização, quando as necessidades são prementes e se agravam tanto na área de assistência, quanto de prevenção”, disse.

“Diante da inadmissibilidade da situação atual, uma medida de caráter político poderia ter sido tomada, como, por exemplo, o estabelecimento de parâmetros administrativos que viabilizassem a utilização do recurso por Estados e municípios”, questionou o coordenador do Unaids.

Primeira Edição © 2011