Falta de médicos e poucos recursos agravam a situação da saúde em AL

O provedor da Santa Casa, Humberto Gomes, avalia atendimento de planos de saúde e culpa governantes por tratarem SUS à míngua

30/07/2012 05:38

A- A+

Luciana Martins - Jornal Primeira Edição

compartilhar:

Falta de médios, por um lado, e falta de recursos públicos para a saúde, por outro. Esses, os grandes problemas enfrentados pelo sistema médico-hospitalar de Alagoas, segundo o Dr. Humberto Gomes de Melo, provedor da Santa Casa de Maceió e presidente do Sindicato dos Hospitais Particulares do Estado. Ele admite que há falhas no setor, mas não considera péssimo o atendimento das operadoras de plano de saúde. Em entrevista exclusiva ao PE, revela o crescimento de usuários de planos em Alagoas e, sem citar nome, alerta para uma operadora nova que está vendendo planos sem ter convênios com os hospitais. Segundo o Dr. Humberto Gomes, a falta de assistência à saúde é o maior problema da população, aqui e em todo o País, mas os governantes nem destinam recursos para o setor. “Eles acham que isso é gasto, não é investimento” – critica.


Qual a principal causa do péssimo atendimento proporcionado pelas operadoras de planos de saúde de Alagoas?
Não concordo com o ‘péssimo atendimento’. Entendo que as operadoras chegaram em muita boa hora para complementar, para dar uma segurança na assistência hospitalar e ambulatorial para aquelas pessoas que podem, em Alagoas. Cerca de 12% da população hoje é usuária de plano de saúde e dentro das condições eles tem oferecido essa segurança. Evidente que tem algumas operadoras que não estão dando aquilo que se comprometeram a dar, mas a maioria tem dado. Tanto que a Santa Casa atende a maioria das operadoras e acho que essa assistência tem sido prestada a contento.

Aqui, quanto mais usuário pagando plano, mas o atendimento se deteriora. Por que?
Não entendo dessa forma. Tanto que houve um crescimento nesses últimos nove anos: nós mais do que duplicamos o número de usuários de plano de saúde em Alagoas. Quando assumi a provedoria em 2003 apenas 6% da população era usuária de plano de saúde, hoje já somos mais de 400 mil usuários no Estado, o que representa 12% da nossa população. Penso que precisa de uma certa adequação, mas que tem sido dado com satisfação uma assistência para os usuários de plano de saúde. Como disse anteriormente, evidente, que alguns mais e outros menos.

O alagoano sempre foi refratário aos planos de saúde. Agora, que as adesões estão crescendo, o atendimento vai mal. Como superar essa situação?
Não é que os alagoanos tenham sido refratários aos planos de saúde. Acho que faltou agressividade das operadoras. No diz respeito às operadoras de celulares a gente vê uma agressividade muito grande, uma concorrência muito grande e uma publicidade muito grande, por isso hoje já temos mais celulares que pessoas, diferentemente do que acontece com as operadoras de planos de saúde. Acho que elas poderiam ser mais agressivas e o exemplo que temos é na distribuição desse 412 mil usuários: no ranking nacional Maceió está numa posição de equilíbrio entre as demais capitais, pelo menos do Nordeste, mas quando se trata do Estado como um todo estamos ainda diferente. Veja: Alagoas tem a mesma população do Rio Grande do Norte e nós temos 150 mil usuários a menos que aquele Estado, isso porque não há uma agressividade no interior do nosso Estado. Ora, temos um população de mais de 2 milhões no interior que poderiam ser contemplados se as operadoras chegassem mais junto a essas pessoas.

Está faltando médico em Alagoas? Por que as operadoras disponibilizam tão poucos profissionais para atender seus segurados?
Está faltando médico em Alagoas. Penso que
Alagoas é um dos Estados que menos forma médico no país. Temos duas escolas que formam um quantitativo menor de profissionais que os demais Estados. E a grande maioria desses médicos formados aqui é de outros Estados e termina não ficando em Alagoas. Outra questão é a remuneração: o sindicato dos médicos tem mostrado que a remuneração em Alagoas é menor que a de estados vizinhos e isso provoca êxodo. Também surgiu recentemente um investimento maior em Sergipe e Pernambuco principalmente em organizações sociais que pagam mais que o SUS. Paga para os prestadores em geral e isso faz com que essas organizações sociais tenham recursos suficientes para tirar os médicos de estados vizinhos, e Alagoas tem sido prejudicada.

Como está a relação dos hospitais com as operadoras de planos?
De uma maneira geral – e falo isso pela Santa Casa – tem sido um relacionamento bom. É um relacionamento comercial que tem que existir e naturalmente cada uma vendo a sua parte, mas temos tido um relacionamento satisfatório com as operadoras de saúde. Mesmo porque elas desejam que seus usuários possam ser bem assistidos e a Santa Casa tem procurado fazer dessa forma. Existem problemas nesse relacionamento com determinadas operadoras porque muitas vezes acertam com o hospital e não acertam com a cooperativa de médicos e aí surgem alguns impasses, mas através de diálogo temos conseguido solucionar.

Uma das principais operadoras do País, a Unimed, enfrenta dificuldades financeiras. O problema é gerencial ou de mercado?
Primeiro, a Unimed não é uma só. São várias ‘Unimedes’ e não se pode falar da Unimed como um todo. O sistema cooperativo, e aí se reúnem todas as Unimedes, é das maiores, mas cada uma é como uma empresa separada. Algumas têm uma administração melhor e outra não tão boa. Algumas passam por dificuldades e outras não. Hoje, com a regulamentação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a situação melhorou muito porque a agência exige que as operadoras encaminhem a cada três meses seus balanços que são publicados e acompanhados com muita transparência. A própria ANS faz uma análise não só dos balanços, mas das situações dos usuários em relação a essas operadoras, inclusive por essa razão é que houve determinadas punições agora e a saúde financeira das operadoras é analisada. Quando está com algum problema, um diretor da própria ANS fiscaliza in loco essa operadora e exige um plano operativo para que possa sanar as dificuldades. Houve uma época em que a nossa maior operadora, que é a Unimed, passou por essa auditoria fiscal, mas conseguiu superar e hoje tem superávit. Naturalmente que ainda tem situações a serem corrigidas diferentemente de outras operadoras de outros Estados que não conseguiram superar isso mesmo com a permanência dessa auditoria fiscal. E a ANS, quando não há essa superação, não permite que o usuário seja prejudicado e a carteira é oferecida para outras operadoras.

A seu ver, o que é possível fazer para normalizar o atendimento aos usuários?
Isso tem sido feito, e aí vem essa salutar medida da ANS. O que critico é a forma como ela foi adotada, não concordamos, mas é importante que haja esse disciplinamento, que haja essa exigência que os usuários possam ser atendidos nas várias especialidades e nos vários hospitais, isso é necessário. Há necessidade de que esse ‘puxão de orelha’ nas operadoras para que possa servir de exemplo para que as falhas sejam corrigidas. É preciso um credenciamento maior de profissionais, sobretudo de profissionais de determinadas especialidades que estão faltando em Alagoas.

A Santa Casa de Maceió, da qual o senhor é provedor, mantém convênios com todas as operadoras de planos de saúde?
Praticamente todas as boas operadoras. Há uma operadora que chegou recentemente ao Estado, e não só a Santa Casa, mas nenhum dos três grandes hospitais tem convênio com ela. E para espanto nosso tal operadora tem conseguido vender muitos planos aqui no Estado. Naturalmente vai gerar dificuldade no atendimento dos usuários. Estranhamos também que essa operadora tem levado pacientes daqui para outros Estados. É uma situação que a população precisa ficar alerta e acreditamos que a ANS deve estar observando. Temos muito cuidado quando se solicita que a Santa Casa seja credenciada por um plano. Fazemos uma avaliação e vez por outra temos que denunciar alguns planos.

O Sistema Único de Saúde (SUS) foi concebido para prestar um atendimento ao menos razoável aos seus pacientes. Por que isso não acontece?
Falta de recursos. Infelizmente os gestores não dão à devida importância à saúde brasileira. Criou-se um plano maravilhoso, que é exemplo para o mundo inteiro, mas, na hora de destinar os recursos os gestores, governantes, não destinam esses recursos. A saúde cada vez mais tem sido o maior problema da população brasileira. Todas as pesquisas em todos os Estados mostram que o grande problema da população brasileira é saúde. E digo sempre que quando a população fala em saúde é a falta de assistência e não a saúde preventiva, nem do medicamento, nem da vacinação, é a saúde da assistência, dessa falta de assistência. E cada vez mais os recursos são insuficientes.

O governo não deveria gastar menos com obras físicas e investir mais na saúde pública?
Não é o investir em obras físicas. Acho que dentro do próprio governo não existe uma continuidade, mesmo sendo governo dos próprios partidos, e não há uma visão do governo para uma saúde assistencial. O governo não quer enxergar: para o governo, como para os dirigentes da área econômica, tudo que se coloca na saúde é gasto, eles não entendem como investimento. E a população, infelizmente, é muito pacata para isto. Ela diz que esse é o seu maior problema, fica nas filas, morrem, morrem não assistidas, e não grita. Com isso os governantes vão deixando de destinar os recursos à saúde. Só vão se lembrar na próxima eleição.

Como está o projeto de ampliação da Santa Casa, com a construção do novo centro hospitalar na Rua Dias Cabral?
A Santa Casa tem procurado investir para cumprir suas obrigações. Há necessidade de ampliação dos seus leitos, houve um aumento do número de usuários dos planos de saúde nesses últimos nove anos e não houve aumento de leitos em Maceió e aí é um sufoco muito grande, os usuários de planos de saúde estão batendo as nossas portas e não temos leitos. Isso não é só na Santa Casa, mas também nos outros hospitais. Digo sempre que se nós não ocuparmos o espaço outro vai chegar para ocupar. A Santa Casa tem atendido ao SUS e destinado ao SUS 60% do seu atendimento. Ela tem se preocupado com a necessidade de crescimento para atender aos usuários de planos de saúde. Esse projeto está caminhando, já estamos com as plantas prontas e já estamos trabalhando o projeto para o financiamento do BNDES e a esperança nossa é que até o fim do ano tenhamos dado entrada no BNDES para que possamos ter um financiamento para essa ampliação e aí darmos o início as obras. Junto com isso temos que tocar as reformas normais que têm sido feitas na Santa Casa para ir atendendo outras necessidades que existem para suprir a carência aqui dentro, o que é cobrado pela população.

 

Primeira Edição © 2011