Filhos de diplomatas estudam pouco sobre os próprios países

24/06/2012 14:37

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Terra

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Sarah Rotta Dunn tem 24 anos e é filha de um diplomata americano e de uma relações-públicas brasileira. Apesar de ser brasileira, nascida no Rio de Janeiro, jamais teve aula de português, história, geografia ou literatura do Brasil. A carioca já morou no Canadá, na Argentina, no Panamá, no Equador e nos Estados Unidos.

Sarah representa um padrão comum na educação de filhos de diplomatas: devido às constantes trocas de endereço, não estudou a cultura da nação onde nasceu. Entretanto, foi alfabetizada em mais de um idioma, conviveu com colegas de várias nacionalidades e obteve conhecimentos sobre história mundial mais aprofundados do que teria em uma escola brasileira.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, diplomatas brasileiros têm liberdade para escolher como será a formação dos filhos - não há colégios exclusivos para eles - e não recebem suporte financeiro do governo para mensalidades escolares. Quando o ensino mantido pelo governo é forte ou o particular é muito caro, a escolha recai sobre um colégio público. No entanto, para que os estudos não fiquem fragmentados devido às viagens, é comum optar por escolas bilíngues francesas, britânicas ou americanas. As instituições formam uma espécie de rede internacional, que unifica o ensino e permite que os estudos possam ser retomados em escolas do grupo em outros países.

Currículo unificado

Os liceus franceses, ligados ao Ministério de Educação da França, têm mais de 100 unidades espalhadas pelo mundo. Todas têm currículo unificado e abordam conteúdos sobre a França e sobre o país onde estão. O Liceu Francês François Mitterrand, em Brasília, é uma das três escolas da rede no Brasil. As aulas seguem o calendário francês - de agosto a junho - e a mensalidade vai de R$ 1.179 no maternal até R$ 1.580 no Ensino Médio. Algumas aulas, assistidas por 400 estudantes de mais de 40 nacionalidades, são em português, mas a maioria é ministrada em francês.

"Estudam aqui filhos de diplomatas brasileiros, franceses e de outras nacionalidades ou filhos de brasileiros que viajam muito, cujos pais querem uma educação francesa", diz a diretora de estudos brasileiros da escola, Adrianna Huelva Unternbaumen. Ela explica que o liceu de Brasília trabalha com os currículos brasileiro e francês - isto é, os jovens vão estudar geografia, literatura e história do Brasil e da França.

Uma forma comum de dar aula envolve o sistema de doublette, no qual há dois professores ao mesmo tempo na sala, ensinando em ambas as línguas. "Cada um fala no momento oportuno, e a aula vai se desenvolvendo nos dois idiomas. Isso pode acontecer em qualquer matéria: de geometria a ciências", conta Adrianna. Ao sair do Ensino Médio, o estudante estará fluente em português, francês, inglês e espanhol e pode prestar o vestibular em qualquer universidade brasileira, francesa, canadense ou de alguns países africanos.

Conteúdos americanos

Diferentemente dos liceus franceses, a rede American School não ministra aulas no idioma do país onde está. Autodenominada escola americana, a rede está em algumas cidades do Brasil, com mensalidades entre R$ 3 mil (para o equivalente à pré-escola) e R$ 5 mil (para o Ensino Médio). Com exceção das aulas de língua portuguesa, todas as disciplinas são trabalhadas em inglês.

O currículo é o mesmo de outras filiais dos Estados Unidos, com o diferencial de que há como optar por matérias eletivas. No Brasil, por exemplo, é possível matricular-se em disciplinas como Estudos Sociais do Brasil, Música, Teatro ou Desenho.

Ao mesmo tempo em que a internacionalidade do ensino ameniza ruídos na hora de se mudar para outro país, ela promove a falta de um aprofundamento em questões de pertencimento a uma nação. Sarah, alfabetizada em inglês e espanhol, aprendeu português com a família e afirma se sentir mais americana do que brasileira. "Quando estou no Brasil, eu me sinto muito diferente, mas quando estou nos Estados Unidos, também", diz. Ela conta, ainda, que sente por não ter estudado história do Brasil, já que é brasileira e reside no País.
Formada em Relações Internacionais e História pela Universidade de Virginia, nos Estados Unidos, Sarah se espelha no pai e deseja ser diplomata. Apesar de identificar deficiências na própria formação, ela pretende seguir a carreira com todas as consequências positivas e negativas. "É um sonho que eu ainda tenho", conta. 

Primeira Edição © 2011