As mudanças e os desafios do setor industrial de Alagoas

Governo comemora números; para especialista, perfil industrial do Estado ainda não foi modificado

30/03/2012 23:01

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Marcela Oliveira e Marigleide Moura

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Os investimentos nos polos industriais, novos postos de trabalho e a instalação de um pouco mais de 50 fábricas estão entre as principais mudanças no setor industrial de Alagoas, contabilizadas pela Secretaria do Planejamento e do Desenvolvimento Econômico (Seplande). Segundo o órgão, graças a esses ‘avanços’, entre os anos de 2007 a 2011, cerca de 5 mil empregos foram gerados no Estado. Apesar disso, na opinião de economistas, o crescimento no setor industrial alagoano foi tímido e os desafios ainda são muitos.

Em entrevista ao Primeira Edição, o secretário-adjunto da Seplande, Keylle André Lima, listou benefícios alcançados nos últimos anos. “De 2007 pra cá, garantimos segurança jurídica; rompemos a burocracia garantindo celeridade; também investimos em infraestrutura nos polos”, disse referindo-se ao polo multissetorial Governador Luiz Cavalcante, no Distrito Industrial, no qual foram investidos R$ 4,2 milhões na revitalização e ao Polo Multifabril José Aprígio Vilela (PJAV), em Marechal Deodoro.

Em quatro anos, conforme a Seplande, o Governo do Estado atraiu seis empreendimentos para o Polo José Aprígio Vilela e garantiu 1.100 postos de trabalho diretos. Houve um incremento de quase 60% na atração de novos negócios e um investimento aproximado de R$ 500 milhões.

Em relação à influência desse crescimento na economia de Alagoas, Keylle lembra o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) – que passou de R$ 19,477 bilhões em 2008 para R$ 21,235 bilhões em 2009, um crescimento real de 2,1%, ficando em décimo lugar no ranking brasileiro.

 “Mensurar o impacto da indústria na economia de Alagoas é difícil, pois interfere em vários setores, como hotelaria, construção civil. A geração de riqueza de uma indústria vai desde a sua implantação. As indústrias enriqueceram o PIB de Alagoas, ficando como o quarto maior do Nordeste; criaram força gravitacional para que outras venham para cá e promovam a geração de renda. Até 2006, o número de empregos na indústria era irrisório. O governo não dava atenção que deveria dá ao setor”, afirma o secretário-adjunto.

Novas indústrias, outras oportunidades

Primeira EdiçãoA Braskem vai inaugurar, em maio deste ano, novas fábricas de PVC e MVC. As unidades vão transformar Alagoas no maior produtor de resina da América Latina. O projeto é de R$ 1 bilhão e elevará a capacidade de fabricação para 460 mil toneladas de PVC por ano.

“O mais importante que ter o título de maior produtor de resina da América Latina é ter a Braskem como âncora para consolidar o setor produtivo da química e do plástico. A partir daí, mais 12 empreendimentos foram atraídos. Essa parceria com a Braskem e a Federação da Indústria permitiu que fosse criado o Núcleo de Tecnologia do Plástico, que hoje é referência para o Brasil para desenvolver produtos na captação da mão de obra e geração de emprego”, disse ele acrescentando que a Cadeia Produtiva da Química e do Plástico foi o segmento que mais cresceu no Estado.

Na lista das próximas indústrias, o Estado já conta com o Estaleiro Eisa a ser instalado em Coruripe, no litoral de Alagoas, e a Mineradora Vale Verde, que ainda não saíram do papel. No mês de abril, duas empresas abrirão novas sedes no Estado. A primeira é a Krona – Tubos e Conexões, localizada no PJAVO – e a outra é a Renove, que trabalha com a produção de biomassa, através da reciclagem de resíduos agroindustriais, como bagaço da cana e cascas de coco. (Ver abaixo o resumo de de projetos industriais – 2007 a 2011)

A perspectiva do governo é de consolidar, ainda neste ano, a atração de outros dez empreendimentos, de médio e grande porte, como a TimacAgro, a Alagoas Pré-Moldados e a Clodax.

Crescimento ainda é tímido no setor, aponta especialista

Marcela Oliveira/Primeira EdiçãoApesar de todos os benefícios listados pelo Governo de Alagoas, em relação ao desenvolvimento econômico trazido pela implantação de novas indústrias no Estado, para especialistas, esse crescimento ainda é bastante tímido.

Para se ter uma ideia de quanto o setor precisa expandir, basta observar os números de geração de emprego, alerta o economista e professor da Universidade Federal de Alagoas, Cícero Péricles.

O professor explica que a expectativa desses novos projetos industriais, que estão efetivamente em operação, e mesmo os antigos que estão sendo ampliados, é, segundo os dados oficiais, de empregar em torno de quatro mil trabalhadores. “É pouco, analisa o professor. Para efeito de comparação: o grupo João Lyra, com seis empresas no Estado, anuncia em sua propaganda que emprega 12 mil trabalhadores em Alagoas”.

No entanto, o especialista diz que o impacto dessas indústrias na economia de Alagoas ainda pode ser considerado positivo. “Todo e qualquer investimento numa economia pobre e pequena sempre causa movimento; por isso, é sempre bem vindo um novo projeto industrial, uma fábrica, na medida em que contribui para a dinâmica econômica local”, disse.

Alagoas x Pernambuco

Sobre a instalação das cerca de 50 indústrias em Alagoas, nos últimos cinco anos, o economista considera um número razoável de investimentos anunciados, mas ao comparar com o desempenho de outros Estados nordestinos, Péricles avalia como baixo o número de empresas implantadas.

“Se pensarmos na necessidade da economia alagoana em ter um parque industrial capaz de, simultaneamente, atender às demandas locais e disputar o mercado regional, estamos longe, bem longe, desta situação”, acrescenta Cícero Péricles.

Para o professor, neste momento, Alagoas enfrenta uma dificuldade adicional que é o ritmo de crescimento de Pernambuco que tem atraído grandes investimentos. “Como é um mercado de renda maior, com mais infraestrutura e conta com um Estado em condições de oferecer contrapartidas, principalmente na região metropolitana do Recife, nosso vizinho se transforma no maior polo de atração de investimentos regionais, dificultando ainda mais os investimentos produtivos que poderiam vir para Alagoas”, apontou.

A indústria como estratégia para Alagoas crescer

Como um dos Estados mais pobres do país, Alagoas sofre pela ausência de polos dinâmicos e diversificados, centrados em indústrias que produzam mais riquezas, empregos e impostos. Daí, decorre o debate sobre como atrair empresas industriais.

Para o economista Cícero Péricles, o Estado tem problemas estruturais graves, como a ausência de mercado local, infraestrutura deficiente e limites financeiros, que impedem políticas mais efetivas na área do desenvolvimento e dificultam a atração e a ampliação dos investimentos. Ele afirma que esse conjunto de pequenos e médios investimentos industriais citados pelo Governo Estadual não irá colocar Alagoas em um nível superior de desenvolvimento.

“Dos grandes projetos anunciados, apenas um - o da planta de PVC da Braskem - é uma realidade, está em construção e será uma grande unidade industrial. Contudo, a nova unidade da Braskem no Estado interessa muito mais a economia brasileira que a economia alagoana. Ele irá atender uma demanda maior por determinados produtos da cadeia química nacional, mas não terá desdobramentos significativos no âmbito local”, assegura.

Ainda segundo o economista Cícero Péricles, isso ocorre primeiro porque, como toda indústria química é intensiva de capital, cria poucos empregos; e segundo, porque o insumo terá um aproveitamento mínimo por parte das empresas locais existentes e que, por isso, quase não terá efeitos multiplicadores no plano da indústria estadual.

“Os outros dois grandes projetos, em valor e número de empregos, o Estaleiro Eisa e a Mineradora Vale Verde, ainda não devem ser contabilizados como indústrias locais porque são incógnitas diante de vários elementos, como problemas com licença ambiental, falta de infraestrutura e indefinições das próprias empresas”, afirma o especialista.

Ainda de acordo com ele, os investimentos efetivados em Alagoas até agora não permitem dizer que o perfil industrial do Estado esteja sendo modificado. “A expectativa de um uma ‘retomada da industrialização’ é força de expressão. Não existe nenhum movimento industrial de porte em Alagoas que justifique essa retomada”, conclui Péricles.

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