Em AL, rombo dos ‘precatórios’ é de R$ 12 bilhões; Estado pagou R$ 1 bi

Conselho Nacional de Justiça quer agilizar pagamentos; 24 mil servidores alagoanos têm créditos a receber

12/03/2012 09:31

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Luciana Martins - Jornal Primeira Edição

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Doze bilhões de reais (quase duas vezes o orçamento anual do Estado, isto é, tudo que a Fazenda arrecada e gasta em 12 meses) é quanto os poderes alagoanos devem à cerca de 24 mil funcionários públicos, referentes a resíduos trabalhistas cujos processos já transitaram em julgado ou foram transformados em precatórios (ordens de pagamento emanadas do Tribunal de Justiça).

A informação foi obtida pelo PRIMEIRA EDIÇÃO junto ao advogado José Lins cujo escritório há anos trabalha na causa dos servidores públicos, especialmente na questão dos precatórios, que são originários dos Planos Collor e Bresser (sobretudo gatilhos salariais e trimestralidade nunca pagos).

Segundo José Lins, dos 25 mil funcionários com direito aos títulos de crédito, até agora apenas 1.105 viram a cor do dinheiro, valendo registrar que muitos já morreram e outros estão com idade muito avançada ou enfrentando doenças crônicas.

Sem dinheiro para tapar o rombo bilionário, o governo de Ronaldo Lessa concebeu uma fórmula engenhosa para sanar as pendências: editou a lei nº 6.410 autorizando que empresas importadoras (como as de telecomunicações) comprassem os créditos dos servidores e fizessem a compensação para pagamento do ICMS, o que evita, por outro lado, perda de receita.

Em fevereiro último, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu entrar na briga para obrigar os estados a pagar os precatórios de natureza trabalhista, o que deverá ter reflexo na ação dos Tribunais de Justiça que, junto com os governos, são responsáveis pela utilização de uma fatia do orçamento estadual para pagamento de precatórios.

A corregedora-geral do CNJ, ministra Eliana Calmon, reconheceu que o calote dos precatórios atenta contra o estado de direito, fere direitos líquidos e certos dos cidadãos, e anunciou sua disposição de cair em cima dos tribunais estaduais para exigir que o pagamento dessas dívidas seja agilizado.

O caso dos precatórios no Brasil é visto como um escândalo e mostra, de forma cruel, como o estado age com seus cidadãos: para cobrar impostos, o faz com a faca no perscoço, mas para pagar o que deve aos seus próprios servidores, impõe todo tipo de percalço e, quando falta argumento plausível, alega ‘falta de dinheiro’.

A VENDA
DivulgaçãoCom a lei nº 6.410, a empresa importadora compra o crédito aplicando um deságio que chaga a 70% do valor de face. O advogado José Lins faz uma simulação: “O servidor que tem direito a R$ 100 mil, recebe em média R$ 30 mil, indo os 70% restante para pagamento do AL-Previdência, do Imposto de Renda e do escritório de advocacia”.

Ele afirma que a transação acaba sendo vantajosa para todas as partes e discrimina: “O Estado ganha porque paga um valor que não tinha condições de pagar, e o servidor ganha porque recebe algo que não tinha como receber, o advogado ganha como intermediador e a empresa ganha em cima do deságio”.

Lins também chama a atenção para o fato de que o Estado, além de se ver livre da pendência, ainda arrecada 11% para o seu Fundo Previdenciário e 27,5% de Imposto de Renda que, sendo descontado dos servidores, acaba ficando na própria Secretaria da Fazenda: “Tudo isso volta a circular na economia estadual”.

O advogado explica que em muitos dos casos não se trata de precatório: “Fosse tudo precatório, o servidor não saberia quando receber, nem teria qualquer expectativa de receber seu dinheiro. Talvez nem se concretizasse. Para o Estado é bom porque se livra da dívida e ainda recebe o AL Previdência e Imposto de Renda. Para a empresa é vantajoso porque de um imposto no valor de R$ 100 mil, ela acaba pagando apenas R$ 30 mil”.

DOZE BILHÕES
Conforme dados do escritório de José Lins, até agora o governo de Alagoas pagou mais de R$ 1 bilhão (valor de face) do total da dívida trabalhista hoje em torno de R$ 12 bilhões. “Somente em fevereiro último – informou – cerca de 55 empresas compraram créditos dos servidores”.

Lins acha que, para aumentar o volume de venda de créditos, está faltando divulgação maior por parte do Estado. “Essa é uma transação segura, legal e transparente”, garante.

De acordo com decreto do governo, em cada lista de pagamento 30% do valor devem se destinar a enfermos, idosos e pequenos valores. O novo decreto baixado no governo Téo Vilela permite que a empresa pague o imposto com o valor total do crédito, o que não era permitido anteriormente.

"Hoje a alíquota é zero, ele pode pagar 100% do valor do imposto (ICMS) com o crédito”.
O advogado reconhece que a empresa ganha muito, mas, a realidade é que os servidores nem sonhavam em receber esses créditos e o advento da lei e dos decretos reguladores só lhes trouxe benefícios. “Isso só aconteceu por conta do deságio. E as diferenças estão sendo corrigidas”.

O servidor que quiser vender seu crédito deve apresentar documento de identidade, CPF, comprovante de residência, ficha financeira e funcional. “Estando com a documentação em ordem, tem que ter a empresa para fazer o processo. Ele tendo a empresa, vem ao escritório e aí tudo é feito pelo escritório”, conclui o advogado José Lins.
 

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