Após crise, países não serão mais os mesmos, diz economista

“Independentemente da crise, os países emergentes passaram a ser também protagonistas nas relações mundiais, e isso não mudará mais", afirmou Fernando Sarti

19/02/2012 12:48

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Jornal do Brasil

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Três anos após a falência de diversos bancos americanos determinando o início da crise do Subprime, o mundo permanece cheio de incertezas. Na Europa, países como a Grécia ainda sofrem para controlar as contas nacionais e aliviar o déficit na economia. E apenas agora os Estados Unidos apresentam indícios de uma retomada no crescimento, embora ainda tímido.

A única certeza é a de que o mundo não será mais o mesmo. É o que acredita o economista Fernando Sarti, diretor da Escola de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp). Para Sarti, as relações comerciais e econômicas que aconteceram nos últimos 30 anos foram determinantes para uma mudança estrutural no planeta.

“Independentemente da crise, os países emergentes passaram a ser também protagonistas nas relações mundiais, e isso não mudará mais. A crise é parte desta mudança, assim como uma evidência clara de que ela aconteceu”, analisa.

Neste tempo, principalmente países como a Coreia e outros asiáticos já vinham desempenhando um papel importante nas relações econômicas, como produtores que ofereciam condições competitivas para as grandes multinacionais.

“As empresas norte-americanas, então, migraram para estes locais mais ‘periféricos’. Porém, o produto final voltava para os centros urbanos dos desenvolvidos, que eram os grandes consumidores”, afirma o economista.

A transferência dessas multinacionais para os emergentes determinou a entrada, principalmente da China, na cadeia econômica mundial. Com isso, a “periferia” também passou a consumir.

“E não foi só um consumo das famílias, mas uma demanda por investimento e capital também, um consumo geral”, relembra Sarti.

Com essa mudança, que, segundo o economista, condicionou uma nova dinâmica no mercado, as consequências da crise ainda são difíceis de prever.

“O que é certo é que tanto a Europa quanto os Estados Unidos sairão mais injustos e desiguais do que entraram”, afirma.

A União Europeia, que já sofre com as diferenças estruturais de cada país membro, deve esquecer o sonho de um “padrão europeu” para todos, acredita Sarti.

O economista diz que, se a infra-estrutura dos países já era desigual, agora essas diferenças ficarão mais claras.

“Além disso, fica evidente que a rede de proteção social destes países será fragilizada. Com o corte de gastos acontecendo na Grécia, Portugal e Espanha para conter o déficit nas contas públicas, a estrutura social será muito afetada e os países sairão da crise menos iguais”, analisa.

Com uma economia dinâmica, um forte mercado interno, uma indústria de alta competitividade e demanda para a exportação, a Alemanha é a única exceção do bloco e deverá continuar "firme e forte", afirma Sarti.

EUA

Os Estados Unidos começam a engatinhar rumo a uma recuperação econômica. Porém, a nova estrutura do mundo não permitirá que o país recupere a força que um dia já teve.

“Com certeza, eles saíram muito mais desiguais e injustos do que quando entraram na crise. Apesar do dinamismo e da força que a economia americana ainda sustenta, com grande capacidade de inovação, falta ao país um setor para liderar a geração de empregos”, afirma.

O problema da desigualdade social e de renda se agrava com a falta de uma rede de proteção social para as camadas mais vulneráveis da população.

“E tem uma questão cultural também, imposta, em que eles ignoram as diferenças de oportunidades da camada mais excluída da população, que não terá a mesma força de competição dos demais”, analisa.

No Brasil, as possibilidades são quase tão grandes quanto as incertezas. Segundo Sarti, o pré-sal e o agronegócio se colocam como boas oportunidades para o crescimento e desenvolvimento do país.

“A oportunidade só será ótima se soubermos aproveitar a demanda que a exploração deste petróleo vai trazer. Não adianta ter demanda para consumir máquinas, se não consumirmos dentro do país, gerando competitividade e desenvolvimento no Brasil. Tanto o agronegócio quanto o pré-sal demandam uma cadeia de fornecimento e consumo que podem ser grandes oportunidades”, acredita.

Para o professor, é preciso que as políticas industriais, tecnológicas e de produção foquem na construção de uma economia abrangente e dinâmica e não se prendam completamente a questões financeiras e de pressão inflacionária, por exemplo.

“Temos excelentes chances a nossa frente, mas depende de como vamos agir em relação a elas. Vamos capturar as oportunidades que surgirem? É uma pergunta para reflexão”, conclui Sarti.  

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