Sem parar: Scheidt quer evoluir até Londres-2012

Bicampeão olímpico se diz apaixonado pela vela e, apesar de favorito ao ouro na classe Star, não pensa nos recordes que pode igualar nas Olimpíadas

13/02/2012 06:31

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Globo Esporte

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Dizer que "um atleta não sabe parar" é uma referência a alguém que já deveria ter se aposentado. Quase sempre. É possível, por exemplo, transportar a expressão para o mundo da vela e falar de Robert Scheidt. A diferença é que o iatista bicampeão olímpico não sabe ficar parado. Aos 38 anos, o paulista não pensa em recordes nem passa tempo demais lembrando de seus feitos - que foram muitos. Ao vencer todas as regatas da Semana Brasileira de Vela, em Búzios (RJ), ao lado do proeiro Bruno Prada, Scheidt só tinha um verbo para conjugar: "evoluir", o mesmo que repete desde sempre.

- O que me motiva muito é a evolução. Evolução técnica, evolução física, o entrosamento... Saber que, hoje, a gente é uma dupla melhor do que era no passado. Saber que a gente daqui a um mês pode ter aprendido mais alguma coisa. O resultado final, a medalha olímpica ou um título mundial, deixa você feliz, mas é naquele dia, naquela semana. Depois, você já está pensando em outro objetivo. Eu sinto prazer por isso: poder evoluir, melhorar - prega.

Foi assim durante toda a carreira. Scheidt nunca ficou parado. Campeão olímpico na classe Laser em Atlanta/1996, o Alemão sofreu um de seus revezes mais duros em Sydney/2000, quando foi superado pelo britânico Ben Ainslie e teve de se contentar com a prata. Hoje, o iatista diz que não leva sensações negativas de suas derrotas, mas admite que levou alguns meses para digerir aquela última regata na Austrália. A resposta veio em Atenas/2004, com outro ouro na classe Laser - com 13 pontos de vantagem sobre o segundo colocado.

Scheidt seguiu sem parar e trocou a Laser pela Star, uma classe que lhe permitiria mais longevidade. Para a nova empreitada, juntou-se ao proeiro Bruno Prada pouco depois de Atenas. A dupla tomou o lugar de Torben Grael e Marcelo Ferreira e foi a Pequim/2008, de onde voltou, não tão satisfeita, com a prata. Os dois ainda queriam - e conseguiriam - evoluir.

- No ciclo olímpico de Pequim, éramos dois velejadores, um de Laser e outro de Finn, tentando velejar de Star. Neste ciclo (de Londres/2012), a gente virou velejador de Star. A gente usou todos os tipos de barco, todos os tipos de vela. Hoje, temos uma companhia que faz velas exclusivas, que a gente desenvolve. Ninguém mais tem. Acabamos melhorando muito, aprendendo a escolher o equipamento, a regular o barco para cada tipo de condição - explica Prada.

O proeiro diz que o treinamento foi como o de artistas circenses: repetir mil vezes para não errar. "E isso não vai garantir que você não vai errar. É só estatística", ressalta, dizendo ainda que o mais importante é treinar sob pressão, com um parceiro exigente. A rotina de treinos e preparação física não incomoda. No fim da tarde, com o Iate Clube de Búzios quase vazio, Scheidt aparecia só de sunga para nadar. Um hábito que vem da época da Laser e que está incorporado à planilha de treinos. E que torna-se mais prazeroso em águas buzianas: "Aqui é uma água quente, deliciosa para nadar, limpa. Na Europa não posso fazer isso". Poucas coisas tiram o bicampeão olímpico do sério. E ele é rápido ao enumerá-las quando indagado:

- Não gosto do trânsito em São Paulo, não gosto de fila, não gosto de burocracia. Eu gosto de fazer as coisas rápido, gosto de gente pró-ativa, gosto de agilidade. Enfim...

Citado como exemplo de comportamento por iatistas mais jovens, como João Hackerott, de 22 anos, vice-campeão em Búzios na Laser, e Jorge Zarif, de 19, que representará o Brasil em Londres na classe Finn, Scheidt não é ligado ao luxo. Em Búzios, ficou hospedado na mesma pousada que os outros competidores. Seus trajes são simples. Durante a competição, varia entre a sunga da natação e a camisa amarela do Banco do Brasil, seu patrocinador. Na festa pós título, em uma badalada casa noturna da cidade, apareceu com camisa e bermuda. Nada de relógios ou adereços chamativos. O mais próximo de extravagância a que Scheidt se dá direito é um pedido aos organizadores.

- A única coisa que às vezes peço é para ficar em um quarto sozinho. Às vezes você dorme com um cara que ronca, outro que sai à noite e chega mais tarde... Eu gosto de ter um pouco de privacidade. Não sou ligado a luxo. Pra mim, ter uma cama boa para dormir está ótimo.

Foco no objetivo mais próximo

Campeões mundiais em Perth (Austrália) e líderes do ranking da Star, Scheidt e Prada chegarão a Londres como grandes favoritos. Em caso de pódio, Scheidt conquistará sua quinta medalha e se igualará a Torben Grael como maior atleta olímpico do Brasil (em número de medalhas). Torben, atualmente, também lidera a lista de atleta com mais medalhas em Olimpíadas. Scheidt, porém, fala nas marcas como distração.

- Eu e o Bruno queremos uma medalha. A gente não está pensando muito em quebra de recordes. Isso tira um pouquinho o foco do atleta. Em lembro em Sydney, quando o pessoal falava muito do bicampeonato olímpico para mim. Isso acaba atrapalhando um pouco. Eu quero pensar em chegar em Londres e fazer o meu melhor. Se isso for um recorde, ótimo.
O mesmo tipo de resposta é dado quando o assunto é Rio/2016:

- Primeiro Londres, né? Depois, o Rio. Vamos por etapas.

Scheidt ainda trata a edição brasileira dos Jogos como um sonho distante, mas não é difícil imaginá-lo competindo em águas cariocas. Ou em qualquer outro mar. Acima de tudo, o paulista se diz um apaixonado pelo iatismo.

- Ainda é muito prazerosa para mim a sensação de velejar. Gosto de usar a força do vento, de conduzir um barco. Gosto da parte da estratégia de uma regata, que mexe muito não só com o físico, mas muito com o mental. A vela é um esporte que te leva para muitos lugares do mundo. Você veleja em lugares paradisíacos. É um estilo de vida bacana, gosto dele. Então, enquanto a gente for competitivo, a gente quer continuar assim.

Primeira Edição © 2011